mercredi 13 mars 2013

Arcádia



O céu se está rasgando sobre os pilares de madeira, e os respingos finos produzem um leve ondular das poças sobre o cimento. Por dentro não há dessa terra, terra vermelha que se umedece sem tornar-se em mistura lamacenta, fazendo com que as folhas caídas se lhe mesclem, e também as raízes grossas dos troncos maiores. Mesmo dos mais esguios saem fios delgados e sinuosos, entrando e saindo do chão, assemelhando-se a um enorme sistema circulatório com muitos metros de área ao entremearem-se nos bancos ali dispostos. Nos bancos e mesas frios as gotas caem e saltam alto, até que são, inevitavelmente, bebidas pela terra. Aquela mesma terra, vermelha.
Os corpos das árvores brilham, e mesmo assim mostram-se como secos, jamais curvam-se sob a notória superioridade da chuva, impondo-se orgulhosos em sua óbvia vulnerabilidade. Mais vulneráveis, porém, são os humanos, encurralados, a rodearem o pátio, esse mar de estrondos abalando-os mais do que as paredes sujeitas a um constante receber de trovões. E a medida que o véu se fecha encolhem-se como presos em uma malha que não os envolve, malha que é na verdade seda sobre o horizonte, a ocultá-lo do sol de verão.
E o verão aos poucos faz-se oculto, faz-se outono, diluindo o azul de seu meio-dia nas folhas que principiam a cair e quebram-se como o biscoito seco da tarde de domingo sob os pés dos sem luz. Por ironia, é na ausência destes que ela se acende e passa a iluminar essa água, essa chuva solitária que cai tristemente calma, apesar da imponência com que o céu mente, rugindo.
Ruge também um bicho acuado, cá para dentro. Não, apenas geme. Não, nem mesmo murmura. Respira fundo e só, mescla euforia e melancolia quanto cai solitário. Solitário como a chuva, em sua calma triste. Mas há luz. Há nostalgia e luz. Há calma e solidão. Apenas não ruge e não faz arco-íris, mas existe. E cai solitário, em silêncio, em horizonte sem fim, em abismo sem tom, onde chove para sempre.

06, Março, 2013

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