lundi 15 août 2016

La Demoiselle de la Rivière

Bom dia, donzela. Quando foi a última vez que to disseram? Ou suis-je sensée vous dire «bonjour»?
                          
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Aquela moça meio transparente, às vezes reluzia à luz do sol, mais comum era, no entanto, que os olhos a atravessassem. Quando ele chegou, ele olhou direto em seus olhos, e não soube o que é que olhava. Soube apenas que a imagem mais bela que já vira estava quebrada, e que ainda que gritassem seus olhos “impecável”, algo o levava inconscientemente a buscar os buracos pelos cantos daquele demi sourire. Era como perder o equilíbrio. Era como ser empurrado e, num repente, déboussoler. Até aquele então, ele não soubera a sensação de não ver muros nos rostos, e prosseguindo sem cuidado, viu-se face a face com o abismo que ela era.
Ela não queria ser multidão, e estendia seus dedos ao máximo tentando impedir-se de ser corrente. “Voltem-me”. E para cima, “Volte-me”. Franziu a testa com o vento, mas seguiu fluidamente seu curso. “Como tem de ser”, ouviu à distancia. “Tu fais la jeune, c’est vrai. Com esse cintilar puro e simples na face”.
Ah, demoiselle. Alguém já lhe perguntou sua idade? Ou quanta história corre nesses seus veios?
Tempo... Desde o infinito ela alimenta e é alimentada sem dizer palavra – sem receber palavra, mantendo seu vidro duro e gelado invisível. “Como tem de ser” – ecoou. E, portanto, intransponível. “T’est charmante”, ela ouviu enquanto ele tentava alcançar o seu horizonte. Alguma vez alguém tentou chegar-te às profundezas? Tocou seu início e seu fim? Alguma vez foste enxergada além, e não através, do teu espelho?
Os insetos a seguem sem a acompanharem, e toda a fauna e toda a flora bebem nela sem beijá-la. Ela espera que perguntem “qui est tu?”, mas a garganta dele é só um vácuo. Afogados, seus olhos flutuam, ele perdido, ela prendida - escura e sem circulação. Ele não sabe ouvir o segredo que conta o rumorejar do suor dela, suor doce e potável. Suor que é neve. Ela vai necrosá-lo quando se aproximar: “seu fogo azul não me curva, humano.”
Ele vê que a ofendem, mas ela não tem cicatrizes. Ele sente o esgoto naquela garganta, mas ela só sabe existir implicitamente. As folhas caídas não sabem do peso que têm, tampouco a inquietude dele. Ele joga a mochila os ombros e deixa um pé vacilar para trás. Ela se debateu, em sua placidez, e seus dedos não o alcançavam.
Então, enfin. Forçando as correntes, ela se ergue. As mechas vão sendo puxadas, deslizando, enquanto ela se levanta, e no seu rosto se revelam as nascentes do mar, dos mares que banhavam aquela criatura.
Ele secoua la tête e deixou-se hesitar por um momento, numa última esperança de descobrir tudo. Que ce soit une piste. Une toute petite piste. Mas não havia nada. Rien de rien. Só aquela cabeleira densa em que seus dedos queriam brincar.
“Um dia, ma demoiselle.”, ele ergueu a voz por sobre a ponte, “um dia eu ainda vou trançar esses cabelos. Un jour.”.
E a deixou por entre medusas de correntes e água.

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à toute, demoiselle. On se reverra.





Há exatamente um ano, ganhava eu meu quarto com clarabóia. O sol dali não me sufocava. As portas tinham aldrabas. E no rio habitava uma demoiselle, de cabelos verdes, olhos cintilantes e voz chorosa, que me cumprimentava todas as manhãs, e escorria boas noites quando o vento batia frio de madrugada.
Mas as cartas foram reembaralhadas e a ampulheta tornou a virar. Como deve ser.