vendredi 24 décembre 2010

Palavras


"Achava que o essencial era perder o medo de vocábulos e frases que eram como façanhudos cães de guarda dos fatos, das coisas e das idéias. (...) Porque o que importava era quebrar o encanto das palavras, enfrentas esses monstros de nossa própria invenção, tratar de debilitá-los, tornando-os inofensivos. Uma vez que transposto o muro que a linguagem ergue entre nós e as coisas que representam, podemos abraçar, aceitar a vida, sem temor nem repugnância."
Dr. Carbone - pág 136 - O Arquipélago - O TEMPO E O VENTO - Érico Veríssimo

      Por vezes é possível perceber que algumas coisas parecem perder o sentido se colocadas em palavras - se ditas nua e cruamente. As coisas belas perdem a magia, pois as palavras limitam tudo o que elas podem significar, toda a sua grandeza. E as coisas ruins... Bem, ficam sem importância. Os maiores medos, se ditos em voz alta, são tornados insensatos e ilógicos.
           Mas as pessoas têm medo das palavras.
         A verdade, a verdade pura, pode muitas vezes soar grosseira e machucar. E então todas as pessoas passam a ter medo de se revelar, de se abrir, porque mesmo aquilo que elas sempre souberam pode parecer cruel e feri-las se ousarem dizê-lo. Por isso simplesmente ignoram, por isso precisam sempre de alguém para lhes estapear e gritar a elas o que precisam admitir.
        O ser humano é covarde. Não com os outros: consigo mesmo. O ser humano tem receio de mostrar para si mesmo o que é.
   .Quando não se define seu sonho, não é preciso correr atrás.
   .Quando não se define o desafio, não é preciso arriscar.
   .Quando não se define a vontade, não é preciso tentar.
   .Quando não se define o medo, não é preciso enfrentá-lo.

         Mas existem as palavras, para nos tirarem do escuro e nos levarem a um rumo certo. Para nos mostrarem o que deve ser feito. Para excluir toda essa paixão que colocamos nas coisas, e nos deixar enfrentá-las sem exageros, pelo que elas realmente são.

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(Falei besteira... mas é isso mesmo... Deixemos para lá esse temor das palavras. Deixemos para lá esse temor da verdade.)

lundi 6 décembre 2010

Contraste

Ela estava sentada a um canto da parede, e estremecia com a brisa gelada; o cheiro da chuva lhe agradava e aquele ruído a confortava. O som das gotas maiores caindo do telhado em pequenas poças a fazia vigilante, acentuando a sensação constante de passos e uma presença oculta. Fechou o livro que tinha nas mãos, tirou um pequeno papel do bolso e começou a dobrá-lo aleatoriamente, apenas para manter suas mãos ocupadas enquanto observava ao redor com o canto dos olhos, pois que sua mente já não se concentrava na leitura.
Por vezes parava, certa de que ouvira algo e de que, desta vez, havia alguém chegando. Tomava coragem e levantava a cabeça, mas novamente era apenas impressão sua. Então voltava à sua calma habitual. Ela se acostumara àquele lugar, onde jamais a incomodavam, mas hoje ela aproveitaria cada segundo e não perderia a queda de uma gota sequer. A chuva era um espetáculo diferente para fazê-la sair da rotina e levantar os olhos das páginas mortas que sempre carregava consigo e dirigí-los a algo vivo e imprevisível. E fazer isto transmitia a ela um sentimento de paz que não podia explicar. Só sabia que gostava daquilo, pois levava-a a pensar em outras coisas que não a sua solidão diária.
De novo ouviu ruídos, agora mais fortes, teve certeza de que havia algo a rondá-la, alguém apareceria desta vez. Hesitou um pouco, o olhar voltado para baixo, com medo do que poderia ser e... E riu de si mesma com um suspiro. Tolinha, não há ninguém para aparecer! Apesar de seus temores e paranóias, ela sabia que não havia vivalma ali, eram apenas temores e paranóias...
Levantou-se, voltou o papel no bolso e acomodou o livro num canto protegido da chuva. Tirou o tênis, apesar do frio, e foi caminhar. A água gelada era desconfortável no começo, mas ela começou a se sentir livre, livre de si mesma. Esticou os braços e fechou os olhos, quando sentiu que não poderia se sentir melhor abriu-os de novo. Só teve tempo para divisar algo pontiagudo vindo em sua direção: rápido demais para ela se esquivar; devagar o bastante para que pudesse percebê-lo.
O sangue espirrou pela sua face, assustando-a. Seu peito ardeu e ela lançou um olhar angustiado para trás, tentando voltar, mas já não podia ver com nitidez. Ela, que nunca se acreditara feliz até então... Ela, que nunca se sentiria livre de novo. De que adiantou tanta exaltação senão para agravar todo o frio e o vazio que vieram depois? De que servia a alegria, se não para mais tarde a torturar com sua lembrança e fazê-la se sentir no profundo de um abismo ainda maior?
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Doce alegria... assassina da esperança.
- For you, Flávia. ;)
http://rsflavia.blogspot.com

lundi 15 novembre 2010

Pain

"Why do we sit around and break each others hearts tonight? (...)" ♪


Por que é tão difícil encarar a verdade?
Foi quando estiquei as mãos para alcançar alguém - com vontade e sinceridade - é que percebi que já havia me metido num caminho sem volta. Não fui feita para as pessoas, não foi assim que me forcei a ser. Não sou assim. Hoje em dia já nem lamento. Algo em mim está quebrado e sei que não vai voltar. De certa forma... já não luto contra isso.
Digo que não lamento, mas não nego que me arrependo - talvez não seja essa a palavra -, me atormento profundamente quando reflito sobre isso. Arrependo-me de não ter notado antes como isso iria me ferir hoje. Quantas vezes o orgulho nos cega e nos faz acreditar que devemos resistir ainda a toda influência de outros? Como agimos tolamente...
Penso em como seria se tivesse percebido antes. Mas, bem... ninguém sabe o que tera acontecido, tampouco devemos pensar nisso. No entanto, nunca me perdoaria se houvesse dado ouvidos à terceiros quando era tempo; nunca me perdoaria por não ter resistido em ser eu mesma e seguir minhas próprias regras.
É tudo tão difícil de compreender... de explicar. No fundo, nós só passamos a ouvir os outros quando suas idéias começam a se expandir, num eco, dentro de nós. Só passamos a ouvi-los quando, em nossa cabeça, é com a nossa voz que suas idéias ecoam.

"Can it be saved 'till we apart?"

lundi 25 octobre 2010

Criatura de Homens*


Analisando a essência humana, o ego é soberano. Pouco se comove com o mal ocorrido a outrem, ou cuja ocorrência é talvez pouco provável. A verdade é egocêntrica: cada um por si e todos por nada. A população não desenvolveu seu caráter socialmente, é o instinto que ainda vigora. Pouco interessa o ladrão, desde que o poder e a privacidade de cada um permaneçam intocados.

O homem não se trata como indivíduo pensante, ainda espera a aceitação do absurdo em suas atitudes, alegando ser esta a sua natureza. Assim, recorremos ao nosso lado animal para justificar nossas misérias. E o Governo é o retrato perfeito disso: uma instituição de homens onde se demonstra toda a falta de escrúpulos humana. Todo esse processo tem início no momento do voto. As escolhas mais importantes são feitas baseando-se em interesses e vantagens próprios e não na comunidade. Esse é o pensamento lógico e instintivo, mas se torna cruel pelo conhecimento de que sua escolha resultará em prejuízo para os outros. Dessa forma, a base política da sociedade rui.
Ao desmoronar do prédio todo, dedos são apontados em todas as direções, mesmo que, intimamente, saiba-se que apontam para um espelho. Mas as criações são reflexos de seus criadores, e o povo se nega a enxergar essa verdade. Julgam-se inocentes e fazem-se de ingênuos, recusando-se a agir ou a tomar decisões. Decidem que a culpa é de todos, e logo não devem colaborar. Cruzam os braços e esperam.
Dessa forma, a solução do problemna não é enjaular os culpados, pois culpados são todos. Se as criações são reflexos de seus criadores, cabe à nós preparar melhor esses criadores, e não caluniar as criações, que são apenas o que foram criadas para ser.

*(Renomeado. Antes: FRANKENSTEIN)

mercredi 13 octobre 2010

Desilusão

Por muito tempo você esteve distante dessa porta, certo de que nada ameaçaria aquilo que ela guardava. Por muito tempo você adiou suas visitas àquele comodozinho por coisas não tão importantes, e repetia a si mesmo que seu tesouro estaria seguro. Mas agora um tremor te percorre o corpo. Algo atrás dessa porta está errado e não pode mais esperar. Algo que talvez já tenha esperado demais.
Você pode ouvir as batidas do seu coração acelerarem ao toque gelado da maçaneta. Com um ruído a porta se abre, você inspira o conhecido aroma doce e por um momento acredita que nada mudou, foi tudo paranóia sua. O grande globo de vidro reluzente está bem no centro, sobre um pedestal esculpido em gesso. Um feixe de luz desce diretamente do teto sobre ele. O resto do cômodo, escuro e vazio, como sempre esteve.
E então você vê. A luz não emite os reflexos confusos, e não há aqueles brilhos coloridos dentro do vidro. Para onde foram? Mas q..? Você chega perto e repara na fina rachadura que riscava o vidro. Dentro deste: nem uma gota. Algo torce seu estômago e um nó sobe para a sua garganta que não te deixa respirar. Você não entende como isso pôde acontecer. Seu olhar desce pela linha fina e úmida no pedestal até alcançar o chão. Seco. Não!! Como? Sinto muito, pelo visto já faz um tempo.
Mas uma luzinha se acende em você, que acaba de reparar nas pequenas poças aqui e ali. Há apenas um modo de recuperar o pouco que resta. Você corre para fora e volta com panos que espalha pelo chão, cobrindo cada canto, para que alguma coisa se salve. Quando acaba, censura-se por ter esquecido os baldes, e sai correndo, novamente.
Enquanto respira fundo e tenta se concentrar, pode sentir seu sangue pulsando. Você tenta descobrir algum otimismo ou esperança no meio do seu desespero. É hora de ver o que sobrou, mas você hesita. Você não pode viver sem isso. Não há um sentido em viver se você perdê-lo...
Quando o trabalho acabou, você mergulhou o rosto nas mãos e chorou. Chorou como um bebê. Intensa e inconsolavelmente.
Porque você torceu os panos, mas estavam todos secos. Completamente secos.
Porque nem uma gota restou.

vendredi 1 octobre 2010

Tempo


Recordar, do latim RE - CORDIS: Voltar a passar pelo coração.

     A cada dia que passa envelhecemos mais. A cada minuto algo já ficou para trás. Cada suspiro nos deixa mais próximos de um fim que não temos idéia de quando virá. Mas não era sobre isso que eu queria falar...
     O que realmente fere, é termos que perder de vista aquilo que somos, para perceber que devíamos ter continuado ali. É só quando o tempo há muito nos afastou de um momento que percebemos o quanto ele era especial. E é sobre isso que escrevo hoje.
     Há dez anos eu nem me passaria pela cabeça o que digo agora; daqui a outros dez, vou perceber como tudo isso é desnecessário e incompleto. Mas ainda assim o direi. Apesar de clichê, nada mais correto que aquela frase que ouvíamos dos adultos quando brigávamos com um "coleguinha" ou quando nos achávamos super-heróis por desenharmos uma casinha com montanhas ao fundo e um pôr-do-sol: Que época boa! Vocês vão sentir falta disso... E a gente sente. Mas não no sentido de querer voltar, a gente lembra, a gente pensa, e fica sonhando acordado, será que naquela época eu esperava me tornar o que sou hoje?
       Com certeza não.
      Naquela época o futuro não existia. Ia chegar quando fosse a hora dele... Na verdade, o futuro ainda não existe. E talvez fosse melhor pararmos de pensar nele, como sabiamente fazíamos há dez anos.

     Ah.. a inocência! Aquela ingenuidade era impagável! A alegria de ganhar uma boneca nova, a tristeza de perder um lápis de cor. Aquele brilho nos olhos que nos denunciava os pensamentos, por mais que fingíssemos não haver nada nos incomodando. Mas o melhor de tudo eram os laços... Na época em que nem nos importávamos com os novos modelos de celulares e nem sonhávamos com tantas redes sociais, na época em que não havia
eu te amo's em todos os lugares e em que não líamos frases bonitas... Naquela época inesquecível, as palavras eram desnecessárias; nós estávamos todos juntos e era isso o que importava. O eu te amo estava em cada gesto, em cada briga, em cada roda, em cada lágrima.
         O eu te amo não existia. E nem precisava.
         A gente sentia. E só.
      Há dez anos, a gente não pensava no fim de nada. Por que nos diziam tanto para aproveitar? Há dez anos nós éramos imortais. Eternas crianças. Não havia razão para termos medo de um dia ir embora, a gente estaria junto todos os dias, não é verdade? Não era... Mas e daí?
         Há dez anos, não existia tempo. E é por isso que era tão lindo...

......................
No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas
Que o vento não conseguiu levar:
Um estribilho antigo
Um carinho no momento preciso
O folhear de um livro de poemas
O cheiro que tinha um dia o próprio vento...
Mário Quintana

Deixo aqui uma homenagem para uma pessoa mais que especial. Para essa prima-irmã de todos os dias, de todas as épocas. Para aquela que há muito me deixou uma cicatriz no rosto e que me fez chorar (e muito!). Para aquela que hoje só me faz rir, só me traz alegrias e momentos bons... E me mostra que por pior que o mundo seja, sempre haverá uma canção... tocando em algum lugar.
Para a minha prima Mariana, deixo um super Feliz Aniversário. E desejo que o tempo nunca apague a sua alegria e que não torne seu coração amargo. Desejo que o tempo não te transforme em sua essência, e que você seja sempre assim, exatamente como é!
(promete que não achou dramático? rs) Eu te amo, de verdade.

samedi 18 septembre 2010

Derrotado...

TUM!
Vai começar de novo. Vem-lhe aquela pancada, mais forte que das outras vezes. Seu coração parece querer arrombar seu peito. Mas ela sabe, no fundo ela sabe - e respira aliviada por isso - que esta foi a primeira da última série delas. Ela sabe que tudo acabará ali.
O lugar está cheio, o que significa que já começou, e que também aqui não falta muito para acabar. O Sol é um globo em chamas. Pequeno. Distante. Terrivelmente belo ele tinge o horizonte com seu tom carmesin. É incrível como consegue dar ao céu tons tão diferentes. Acima vê-se um azul límpido, mas ao abaixar o olhar, há bem à frente montanhas pálidas e um céu esbranquiçado. E perto do Sol, um brilho cor de sangue. Aquelas... TUM!
TUM! TUM! De novo. Ela só teme que ainda demore muito. A dor é profunda e leva-lhe ao desespero. Ela não tem medo, desde que acabe logo. Pela janela, vê um vulto negro sobre uma montanha menos distante. É só um menino soltando pipa, caminhando ao Sol...
O Sol, como notaram, está bem mais baixo. As montanhas mais próximas dele parecem estar em chamas. As labaredas avançam lentamente sobre a Terra. As pessoas ao redor ficam em silêncio e assistem hipnotizadas ao espetáculo à frente. Sabem que algo está para acontecer.
TUM! TUM! Ela aperta a mão contra o peito como se tentasse arrancá-lo. Não entende porque ainda não perdeu a consciência como sempre acontece. Será que a farão ver tudo, sentir a última lufada de ar deixar seus pulmões? Ela arfa violentamente e seu rosto molhado se contrai. A dor é tanta que já não chora, apesar de ainda ter o gosto salgado das últimas lágrimas nos lábios. Não que ela não goste... TUM!
As montanhas reagem, não se deixarão devorar pelo Sol. Já se percebem falhas no contorno do grande astro. O céu acima está enegrecendo, e se pode ver a Lua. O Sol brilha, torna-se mais vermelho, mas todos sabem que ele está perdido. "Assim como eu", pensa ela, "ele luta sua última batalha".
TUM! Ela não pode suportar mais. Deitada em seus lençóis revirados solta um urro que assusta a todos por perto. Um urro vindo do mais profundo de seu ser, libertando toda a sua dor.
Os olhos ansiosos brilham em lágrimas. As mãos rígidas. O grande inimigo está sendo derrotado.
TUM! Alguns segundos. TUM! O fim é evidente. TUM!
TUM! A última batida virá. Ela está inerte na cama. Esperando. Seus olhos fixam-se no último raio de sol vindo pela janela. Ela pisca para a primeira estrela que surge no céu. Seu tormento finda. A última batida vem. TUM!
Então todos sorriem e batem palmas. Há lágrimas em todas as faces. A última chama se apaga e deixa o céu.
Ela está em paz.

jeudi 2 septembre 2010

Inevitável


♪ "And here I am now, taking the pieces of light... In my soul so dark, silent screams of pain... " ♫

         Não adianta negar, você sempre diz que não se importa, mas é inevitável. Você sempre espera algo. E à meia noite o seu coração bate mais forte. O que vai acontecer? É claro que você sabe que será o mesmo de sempre, mas é involuntário... Então você acorda diferente, olha para as pessoas de modo diferente - e tem a estúpida impressão de que os olhos delas estão diferentes também. Você morde os lábios, e caminha olhando para os lados, pensando em quem virá primeiro. Depois de um tempo você vê que é apenas mais um dia como qualquer outro, e que poucos notarão como você está mais leve hoje. Mas há sempre aquele alguém que dá o grito, e logo algumas vozes se levantam. Sem entusiasmo algum. Os abraços mal te tocam, os sorrisos não demonstram a alegria que deveriam, e os olhos... eles não sorriem como os lábios. Eles não brilham, e te mostram que, no fundo, tanto faz que dia é hoje.
             Você sorri de volta, você tenta se contentar. Mas a sua voz, que queria gritar, nada mais é que um sussurro envergonhado, e você agora esconde atrás de um sorriso tímido a sua vontade de fugir. E os olhos... Se alguém se importasse o bastante para olhar dentro deles, veria que a luz que deles irradiava quando se abriram tornou-se opaca ao passar pela primeira pessoa, e se agora há algum sinal de vida, é a tristeza que eles refletem, é o pesar que encobrem.
              E então o dia que tanto demorou a chegar, agora parece não querer acabar...
             E aqueles que você esperava que se importassem, não estão com você. Eles não te abraçarão, nem te sorrirão com os olhos...

♪ "And then someday I will be free!"



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ANIVERSÁRIO - Fernando Pessoa

No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,

Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No TEMPO em que festejavam o dia dos meus anos,

Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,

O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!

O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,

Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...

(...)

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...

A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!

Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...

mercredi 18 août 2010

Um Embate Ético

O universo científico sempre passou por vários confrontos, mas a situação se torna mais polêmica a medida que novas tecnologias são desenvolvidas. Depois de temas como o aborto e a eutanásia, o que preocupa a população científica são as divergências a respeito de formas sintéticas de vida e clonagem - que não é um tema novo, mas voltou aos debates. Recentemente foi publicada uma experiência onde seres vivos foram reproduzidos em laboratórios ou, como preferiram dizer, a primeira criatura viva cujo pai é um computador. Agora o foco é a clonagem e a reprodução artificial humana. Novamente a grande dúvida: seria correto começar a vida dessa forma?
Os representantes das inúmeras religiões representam um grande rival a esses experimentos, alegando ser essa uma atitude que nega a ordem natural da vida. Cada ser humano deve nascer naturalmente em uma família, crescer e formar laços sociais. Não se é permitido "brincar de Deus", pois a vida criada artificialmente desregularia toda a sociedade atual e mexeria com a nossa consciência de indivíduo.
Muitas vezes, dentro da própria comunidade científica, se pergunta se realmente vale a pena continuar tentando. É clara à todos a possibilidade das experiências em humanos e, cientificamente, não há empecilhos a isso, mas há uma lei natural e deve ser respeitada. Questionam-se os benefícios que poderiam ser alcançados e se eles justificam toda essa reviravolta. O conhecimento pelo conhecimento pode ser atraente, mas em se falando de vida, os fins devem ao menos justificar os meios. Esse tipo de conquista traria avanços imensos à medicina, por exemplo. Mas então qual seria o fim disso? A imortalidade?
A verdade é que ninguém quer topar consigo mesmo caminhando por aí, tampouco dizer que nasceu num laboratório. Seria correto interferir em tudo dessa forma? Não temos esse poder. É só parar e observar o que fizeram aqueles que pensaram ter a decisão da morte nas mãos. A sociedade atual é imatura e inconsequente; por mais que esses pareçam passos insignificantes ou simples, é desse modo que se começa. Não estamos prontos para decidirmos entre a vida e a morte, sabemos disso e ainda assim agimos cruelmente e não sabemos até onde chegaremos nesse ritmo. O ser humano não é tão racional assim. O medo da morte existe e está nos cegando. Só que no fim optaremos espontaneamente por uma vida finita e cheia de riscos, a fim de aproveitá-la mais intensamente. Ninguém vai querer viver no mundo que está por vir. Não eu.

samedi 24 juillet 2010

Reflexões, reflexos...


Os livros são como espelhos: neles só se vê o que possuímos por dentro.
        Não, ela já não se lembra do autor, mas sabe-se que essa frase, lida há muito tempo, a chocou um pouco. Talvez por toda a verdade contida nela, ou não... É verdade que os livros são portais encantados que levam a cômodos secretos da própria mente de quem lê; é neles que se vêem pensamentos desconhecidos para quem os pensa, é neles que se encontram, colocados em palavras, os sentimentos mais profundos de quem sente. Ela se surpreendia em como aquelas palavras que tanto se esforçava por encontrar e por em ordem se mostravam tão bem colocadas nas páginas de seus livros, tão facilmente encaixadas, e significando tão perfeitamente suas idéias como ela jamais se veria capaz de fazer. Ela se sentia triste por nunca conseguir que as palavras lhe obedecessem, e se espantava com o modo como elas conseguiam dizer tudo o que ela queria, e muito mais, quando usadas por outros. Como puderam roubar-lhe as idéias sem que notasse? Como podem esses simples livros guardar todos os seus sonhos?
           Mas, ela parou pra pensar e... esses livros jamais lhe seriam como espelhos. Eles eram mais... eram a única coisa capaz de preencher os espaços vazios de sua mente, cada canto e cada vão, por menor que fosse. Eles clareavam os caminhos ocultos e lhe mostravam passagens pelas quais ela nunca havia passado. E por mais livros que tivessem lido, sempre cabia mais, eles não ocupavam espaço. Ela então descobriu a comparação perfeita. Livros eram Luz. Eram os livros que a completavam. E ela buscava neles todo o sabor de que sentia falta em sua vida. Quando lia absorvia tudo. Ela sofria, chorava e ria, assim como aqueles que estavam presos às páginas, e trazia-os ao mundo real. Fazia seus aqueles sonhos e objetivos, mesmo que já soubesse se seriam ou não alcançados. Os livros a tiravam da monotonia da realidade, pois nos livros ela se perdia nas aventuras pelas quais jamais passaria, realizava os seus sonhos sufocados, sentia as dores que não podia demonstrar e vivia os romances que lhe proibiam; neles, amou os amigos que não teve e mergulhou em paixões impossíveis. Nos livros ela conheceu a vida em sua essência, aquela vida que começaram a lhe tirar desde o seu primeiro passo.
         Ela não sentia como se vivesse, apenas sentia uma existência estranha, esgotando-se. Então ela aprendeu a sugar dos livros até as idéias mais profundas, para lhe darem força. Pois a realidade ensinou-a a não sentir. E ela não aprendeu. Tiraram-lhe então o que sentir, tiraram de sua existência todo o brilho e a emoção, todo o gosto e o ânimo. Então nos livros roubava sentimentos que não eram seus, apenas por saber que a vida jamais lhe despertaria sentimento algum. Com o tempo, aprendeu a sentir cada letra e cada vírgula; e para cada livro que terminava mandava embora um pedacinho de sua alma, mandava-os todos para Valinor, onde seus sonhos nunca morreriam, onde seria para sempre livre.
              Onde sentiria-se eternamente viva.

vendredi 18 juin 2010

Breaking Chains


Apesar de não ter sido a intenção inicial, posto esse texto em homenagem a um amigo. A alguem que me mostrou o valor de uma verdadeira amizade, ao meu único companheiro nesse mundo de fantasmas e medos.

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- Hoje voltei da escola um tanto preocupada. Dormi às portas daquele mundo surreal. Genial, sem dúvida, mas paranóico, com certeza. Por que me preocupo tanto com o tempo? Sei que é relativo - tudo o é -, mas há algo mais. Algo que me atormenta. Já não falo disso com ninguém de medo do que vão pensar. Será que estou enlouquecendo? É verdade que às vezes penso se isso é mesmo real, se não sou só uma imagem que existiu há muito tempo na cabeça de alguém. Fico pensando se me transformei num livro... Terei sido mundialmente famosa como a Branca de Neve ou a Rapunzel? Ou será que não me deram muita atenção? Terá o autor me abandonado por vergonha e decepção?
- Quando paro para observar, reparo que os bons momentos passam velozes, e logo se tornam nada mais que imagens distantes, sonhos dos quais já acordei. Terei eu sido um diário onde só eram depositadas mágoas? Possivelmente, pois as minhas permanecem eternamente vívidas, como se tivessem acabado de acontecer. É óbvio.. ninguém escreveria alegrias! Estas se cantam, bradam e proclamam aos ventos! huh.. É... quem sabe eu fui a tristeza de alguém; deixaram-me à soleira da porta, a observar os sorrisos passando e levando o tempo com eles. Nesse interim, perdi meu caminho, e me estacionei no tempo, em alguma dimensão estranha.
- Ouvi, entre tantas outras loucuras dos adultos, que talvez esse universo enorme não passe de uma fração de um universo maior ainda. Será possível? Tenho tanto medo do que está por vir... Às vezes quero que tudo se exploda e voe pelos ares, e assim acabe logo com essa angústia, antes que algo pior nos aconteça. Mas no minuto seguinte quero que tudo dure um pouco mais, a fim de ver o que ainda virá. Para saber o que nos tornaremos.
- De qualquer forma, amiguinha, quando cheguei pensei que já fosse tarde demais, e chorei. Mas já me explicaram que não é por muito tempo, e que logo você se libertará desse casulo e voltará para mim. Talvez deva sempre ser assim, a gente abre mão de algo para ganhar outro. Mas é triste quando algo bom passa a ser lembrança, não acha? Será que me lembrarei de você para sempre, ou você se tornará outra memória distante? Quando você voltar, eu... eu prometo que te deixarei partir. Não sei quanto tempo terá para ver tudo de belo que ainda existe, mas não se aborreça com os terrores que encontrará, lembre-se de que nem todo livro tem um final feliz. Nem todas são belas e perfeitas como você.
- Talvez o livro acabe antes que você acorde, espero que não. Dizem que sou um tanto boba, mas você me compreende, não? Apenas me faça um favor: mostre-se a mim antes de partir, quero ver a cor de suas asas. Não me dê atenção se eu chorar, quem sabe esse não seja o final do livro? Um final feliz, talvez:

"E a menina viu da janela o brilho distante de suas asas, e a observou subir até o último reflexo de sol fazer brilhas as cores mais belas que já vira... FIM!"

- Bem, prometo segurar a capa para que o mundo não acabe antes disso. Mesmo que minhas mãos se quebrem, a história não pode acabar sem que eu te veja mais uma vez... Antes do nosso adeus, minha fiel companheira...

mardi 1 juin 2010

Um Discurso Qualquer


Abaixo postei o discurso que escrevi para minha formatura do E.F. Apesar de não ter agradado a alguns, os estudantes a quem me dirigia aprovaram, e também muitos dos pais presentes. Analisando agora, realmente acho que não foi tão adequado para uma formatura, mas também cheguei a conclusão de que não adiantaria, eu jamais diria a frente de várias pessoas algo que eu não aceite em meus pensamentos, algo que não soe como meu.

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(Novembro/2009)

"Nós alunos aqui estamos para concluir mais uma etapa, mais uma fase de nossa vida e de nossa formação. O que diremos... ou melhor, o que ouviremos em um momento como esse? Os eternos exemplos de auto-confianca, perseverança, honestidade e amor? Talvez... Mas acho que já somos um pouco maduros, já ouvimos dessas coisas muitas vezes. E ainda ouviremos. As pessoas tentam nos falar de um mundo lá fora, da tal vida que vamos enfrentar, mas ela parece nunca chegar.
O que busco, hoje, é abrir novos horizontes, porque a vida... a vida não é amanhã ou daqui a um mês. Ela é o agora, é o hoje; e nós aprendemos a lidar com ela a cada momento, a cada novo desafio. Como agora, seja a escolha da faculdade; ou de onde faremos nosso Ensino Médio. Devemos procurar novas oportunidades e deixarmos para trás tantos amigos? Os amigos que sempre estiveram conosco, vão se afastar agora? São muitas os pensamentos que nos vêm à cabeça neste fim de etapa, mesmo que muitos não as compreendam ou julguem sem importância.
No entanto, entre tantas escolhas, o nosso mal é continuar baseando nossa vida em poesias e frases bonitas. Em velhas histórias com moral. O nosso mal é continuarmos a ouvir de nossos pais ou professores histórias que só têm beleza em sua voz, mas que nunca trazemos para a NOSSA realidade.
Continuamos a encarar a vida como aquele 'palco', sem dar-nos conta de que mesmo os protagonistas só estão ali para cumprir o roteiro de terceiros, e para agradar uma platéia. Nas nossas próximas escolhas, cumpramos o NOSSO roteiro. Esqueçamos a coisa da 'estrada da vida'. Não.. nós não estamos seguindo por uma estrada, pois que não há caminhos certos ou placas, não há indicações, tampouco mapas! Devemos nos preparar para seguirmos por lugares desconhecidos, jamais explorados; para criarmos nosso próprio caminho. E não esperemos que cuidem de nós como das flores, às quais tanto somos comparados, às quais tanto NOS comparamos. Pois elas necessitam de cuidados especiais, nós não. Nós buscamos independência. Tanto como estudantes quanto como profissionais, devemos estar preparados para florescer em todo lugar, para ousar e criar novas opções quando as já dadas não agradarem.
E 'ousar' inclui encarar a vida, encarar cada momento, como uma nova aventura. Sem a mania de compararmos tudo. A vida não se iguala a palcos, estradas, flores, livros, jogos... enfim! Cada vida é única. Cada escolha é uma só, e pode mudar tudo, mesmo que não percebamos no início.
Aprendam, leiam, cantem, falem, riam, chorem... Mas de cada ação, aprendam alguma coisa, seja para fazer, ou para NÃO fazer. Mas aprendam!
O que espero para cada um dos formandos é que vivam para realizar sonhos, para buscar algo, alcançar metas. Nunca desistam dos sonhos. Vibrem com cada conquista, e jamais a encarem como a última. Dêem um próprio significado para a vida de vocês, não importa que ele esteja em alguém, em algum lugar ou em alguma profissão. Só não vivam por nada.
Saiam daqui, hoje, com a consciência de que a chave de tudo é a dedicação. Independente do que estejam fazendo, façam com vontade, com afinco. Desejem aquilo que fazem. Para os que vão para a faculdade agora, vale lembrar de que a profissão, por melhor que seja, é um meio, nunca um fim. O trabalho não deve servir para trazer mais trabalho, mas para trazer realizações.
Pensem no mundo que cada um de vocês tem em mãos, e cuidem bem dele."

jeudi 13 mai 2010

CRISE


Estúpido! Se existe um "Deus", então é um idiota! Brinca conosco como se fossemos nada, como se estivéssemos à disposição. Mas não vou ser palhaça, não sirvo para atriz, repudio esse humor negro. E essas falsas alegrias... É incrível como conseguem nos por exatamente onde não queremos estar (ou será que nós é que nos pomos?).
Não é irônico que cresça bem ao meu lado esse mal que tanto desprezo? Que eu conviva dia-a-dia com a personificação de tudo aquilo que combato? Não me importa mais "mudar o mundo". Tenho nojo de mim por ser quem sou. Detesto olhar para o lado e ver que tudo o que mais odeio está cada vez mais perto, e avança, como uma praga. Resistir? Ah, eu resisto. E você não faz ideia do quanto sofro com isso. A verdade é que me sinto uma hipócrita. Quando olho para as outras pessoas vejo alegria, vejo orgulho, mesmos de seus próprios defeitos. Mas eu (claro...) sempre me sinto mal. Não admito erros. Não suporto falhas. Envergonho-me de atos que não pratiquei. Arrependo-me de "crimes" que não cometi. Só por tê-los presenciado, só por saber que existem.
Como são todos mesquinhos e inúteis! Como eu daria tudo por não existir! Como é mais difícil suportar a medida que percebemos que ao nosso redor todos trocam suas máscaras despudoradamente. Ah, mas não... novamente esqueço-me de que não há 'nós'. Sou sempre eu, sempre sozinha, sempre a única. A única desocupada o bastante para parar e observar. E como é ridículo não perceberem. É tão óbvio! Por isso tanto evito e desaprovo elogios, mesmo os mais sinceros... Aqueles que os proferem nada sabem daqueles a quem se referem. Idolatram imagens, sem enxergar o quão mesquinhas são as almas por trás de toda essa maquilagem.
Desculpem-me. Nem sei o que escrevi. Tampouco vou reler... tenho medo. Só queria gritar... Mas agora eu tenho um refúgio, um lugar só meu. E a partir de hoje não gritarei mais. Meus gritos sufocados rasgarão o papel. Minhas lágrimas, forçadamente contidas, sairão pela caneta, e preencherão esses rasgos, como pequenas gotas de sangue, como se ali servissem mais do que escorrendo em minha face. Não as culpo. Eu faria a mesma escolha.

(Texto de 30/Abril/2010 - 22:13)

mardi 4 mai 2010

Devaneios de uma Noite de Apagão


         A noite está mais escura hoje. Mas as estrelas estão maiores. É estranho abrir a janela e não ver luzes na cidade. Apenas vultos escuros erguem-se ao redor. E em meio ao tédio e ao desespero, estranhamente as pessoas se unem para compartilhar sentimentos que não têm.
       A eletricidade se tornou tão básica e rotineira que nem mais a notamos. Como algo assim, sem vida, pode ter tamanho controle sobre nós? Particularmente, não vejo problema algum em ler ou escrever à luz de velas. Na verdade, sinto-me bem. Muito bem. Mas essa não foi a ideia inicial.
         De um jeito ou de outro, continuemos.
       Quando a vista cansou, soprei vela, liguei uma música, e me deitei. Assim mesmo, no escuro, nesse escuro que tantos temem e odeiam, pois aqui a música ganha vida. Cada nota soa maior, ecoa no mais profundo de mim. E a gente pára para pensar em cada minuto, cada voz, cada olhar, cada tom. Eu fico aqui, enquanto outros se desesperam e se entediam. E esses "outros" até que percebem que não estão sozinhos em casa. ó! Mas essa afetividade repentina é tão estranha... e é barulhenta! Talvez demais para mim. Mais incômoda até que o desespero ou a impaciência.
       As vozes deles se elevam, bem animadas, posso dizer. Chegam a ser contagi... não... não são... Eu não sou uma delas! Não sou! Não consigo ser! Mal chego a um sussurro! Esqueci-me de que não faço parte disso. Nunca faço. Devo me conformar.

(♪I’m safe in here. I’m where I’d want to be..)

Uau! Perfeita para o momento! Parece zombar de mim.
Com essas luzes apagadas me sinto tão boba! Mas... bem, vejo que me perdi de novo. 
 
       Voltando ao início: Fico pensando... Onde está a poesia que diziam haver no mundo? Frases e momentos só têm beleza nos livros?
      Não há luz. E o que fazemos? Oras. Conversamos! Mas, bem, eu... eu não. Eu observo. E penso. No escuro é tão fácil! A solidão que saboreio é doce. Ela cresce e me faz crescer também. Abro a janela. O céu brilha tanto. Sinto-me pequena de novo.
       Uma voz na escuridão.
       - O que faz na janela?
       - Nada. Tem um bichinho aqui.
     Ridículo. Quebrou o clima. Deito-me num colchão no chão. A música está alta e ocupa cada canto, parece vir de dentro, de fora, das paredes, do vento. O céu está tão claro. Sigo um avião, um pontinho branco e vermelho, uma luzinha, que flutua, até mergulhar na parede... e sumir. As estrelas brilham, grandes, belas. E há uma brisa entrando. A luz da vela oscila ao meu lado e me embaralha a visão das linhas do caderno. Ela pára. Inclina-se. Pára de novo. Não me importa. Estou me libertando.
      "Morte", ele diz, "é isso que aprende nos livros que tanto lê?" Não, não é... – penso comigo.
       Dou uma olhada para trás, para as estrelas, e certifico-me de que elas não se foram, de que ainda não estou sozinha. Acho que hoje elas não vão embora. É. O ser humano perdeu completamente a sensibilidade. CALEM-SE! OLHEM PARA FORA! TOLOS! Será que não percebem? É nas trevas que a luz tem mais força! É na luz da noite que as estrelas são maiores! É como se elas dissessem: acalmem-se; estamos aqui. Sim. É isso que aprendo nos livros. A poesia do mundo. A beleza dos detalhes. Aprendo a apreciar.
Feche os olhos. Ouça a melodia do silêncio. Ouça as estrelas chamando. Apague as luzes. Aprecie o brilho da escuridão. As diferentes matizes do nada. Tranque a porta. Sinta a presença da solidão. Converse com a lua.
Olho para estrelas numa noite de verão. Olho para o céu claro da noite.
Quem precisa da música? Eu tenho o silêncio.
Quem precisa de companhia? Eu tenho a solidão.
Quem precisa de lâmpadas? Eu tenho uma infinidade de estrelas só para mim...
          E a Lua...

lundi 26 avril 2010

Broken Fairy Tales


...e sempre ouço-os dizendo que nunca faço mal a ninguém, que sou boazinha demais...
     Será que não percebem ser este o meu erro? O meu MAIOR erro?
    O que por vezes me vem em pensamentos é que esqueci de crescer. Tento ser de uma falsa inocência que sei ser impossível, que sei que não dá! Esqueci de sair dos meus contos de fadas. Fechei-me num mundo só meu. Um mundo de mentiras e ilusões. Um mundo que nunca vai existir. Um mundo de vilões e mocinhos. De bruxas e fadas. De dragões e cavaleiros. Um mundo onde o Bem e o Mal podem ser separados como a clara da gema, como a noite do dia. Um mundo onde as pessoas são simplesmente boas ou más.
    Só me esqueci de que bom não é sinonimo de perfeito. E que o mau não é de todo "prejudicial". Não aprendi a aceitar que há altos e baixos, que há "compensações" para tudo o que é demais. Não aprendi que a noite foi separada do dia, mas que inventaram a madrugada e o entardecer. E é isso me destrói por dentro, dia a dia. Costumo tentar ser a "boazinha", a "perfeitinha", a "heroína". E.. argh! Não.. não serei. NUNCA! E me dói ver que os que tanto amo podem ter mais de vilões do que eu a princípio imaginava; e que os mocinhos não são sempre bons. Esqueci que também os maus podem ter coração... E eu: tenho nada...
      E há momentos em que meu mundo estremece, eu descubro que não posso consertá-lo com as minhas próprias mãos, que não sou tão forte assim. A verdade é que sou fraca, muito fraca. Esse tremor faz a realidade pesar. Ela empurra o teto, que vem abaixo, em pedaços. Só que eles me machucam, me cortam, me fazem sangrar, me fazem chorar, me fazem gritar... Só que nesse mundo não há ninguém. Nunca houve. Apenas mais vultos e ilusões, que acreditei serem reais. Alguns vinham de passagem, mas ninguém quis ficar. Ao longe, o que fazem é rir; rir de mim, da minha ilusão, desses meus sonhos infantis, dessa minha esperança tola. "Pobre coitada", devem dizer, "Não lhe disseram que a Cinderela não existe e que a vovózinha morreu; e que essa mentira dentro da qual vive não pode ser colada, caco a caco, com cola quente ou Super Bonder. Ela se recusa a ver a verdade, maior e maior, a invadir-lhe os pensamentos; se recusa a acreditar que esse terror é a realidade que ela não suporta ver..."
       Ela se machuca, ela sangra, ela chora, ela grita.. Mas nesse mundo não há ninguém. Nunca houve.