dimanche 2 septembre 2012

O Absurdo

           É que então vem  o cansaço. Um tédio de morte em um ar abafado.
         É que então um peso enorme me acomete, como se sustentasse o mundo inteiro. Como se todas as eras tivessem passado por sobre mim. Como se todos os sorrisos sorridos fossem fendas de minha própria boca. Como se todas as lágrimas derramadas fossem o meu próprio pesar - arrancado e liquefeito. Como se tivesse eu morrido todas as mortes. Como se tivesse eu vivido todos os longos anos que seguem cada nascer. É que de repente o mundo me puxa para baixo - uma gravidade insana a levar cada instante. E é como se todas as experiências tivessem me ocorrido sobre o corpo fraco - desgastando-me a mente. E fui eu a lutar cada guerra, a sustentar cada coroa, a ser dilacerada por toda espada e atravessada por cada flecha.
           E foi sobre mim que caiu a neve. E foi de mim que rolou cada gota de chuva, que suou todo o orvalho na aurora. Foi dos restos de minha ruína que caíram as pedras. Meus ossos ergueram montanhas e meu suspiro as derrubou. E cada gota do meu sangue se esvaiu em dilúvios pelo universo. E cada estrela partiu de mim.
         E então me vejo: débil. Nesse constantemente nascer, me perder, e partir. E o mundo se me pesa. Como se eu o sustentasse. Inteiro.
           É que eu nasci todas as vidas.
           É que, a cada dia, eu morri todas as mortes.

           É que então eu sou um fragmento da Ilha. É que eu me sinto o Continente inteiro. Fragmentado.

           E eu me sinto tão fraca. Tão... velha.

           E os sinos... Os sinos estão tocando.

6 commentaires:

  1. Várias interpretações!

    Antes do mundo ser mundo, a ideia de mundo, descansou e ao descansar, ela "sonhou" para não mais despertar. Foi assim que surgiu o que deveria surgir... Um erro! Mas se ela estivesse desperta, será que "você" aconteceria?

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  2. O epifenômeno do ser.

    Essa Marô! A cada dia melhor. Parabéns pelo belíssimo texto.

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  3. A cada dia e a cada hora, a cada minuto e segundo tem um maldito pra te atirar uma flecha, te achar com uma espada, e a cada novo dia te arrancam um novo pedaço seu, te quebram um novo osso, te matam uma nova vez, e a gente se mata uma nova vez a cada dia que passa. E depois que não tem mais nada a gente tenta colar os cacos que a gente separou, que separaram da gente, e a gente cola eles como acha melhor, mas não tem porcaria nenhuma que dê jeito por completo nessas coisas, nem remorso, nem vingança, e a gente fica tentando ressuscitar uma coisa que nunca mais vai voltar;

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