"Our race into the night, my friend, has barely begun..."
('How Many More of These?', Mikael Karlsson)
John Milton, Paradise Lost [Frankenstein's epigraph] |
Sem muita graciosidade a toalha se desenrola e ela vê, sem emoção,
os pedacinhos brancos caindo sobre a água e uma fraca nuvem de pó
se dissolvendo.
Missão cumprida, pensa. Mais uma semana. E vai
rasgando as linhas do seu calendário mental enquanto dobra a toalha.
- Que existência estúpida.
Ela o diz despertando num repente de seu mover-se mecânico e de seu
olhar inexpressivo. Aquelas lascas de unha cresceram por, quanto?,
uma semana? Menos? Apenas para serem cortadas e dispensadas. Que
fizeram além de partirem-se, sujarem-se e enroscarem-se em qualquer
coisa? Para que existiram além de tornarem-se em incômodo e
despertarem nada mais do que o profundo desejo de serem destruídas?
Talvez tenham sido úteis contra algum cravo ou espinha, mas somente
para substituí-los por feridas mais profundas. Talvez tenham sido
úteis para o rompimento de um lacre qualquer, para descolar um
adesivo velho, mas tanto para tal servem, que partem-se em seguida e
não podem ser usadas uma segunda vez. Talvez tenham sido úteis para
ferir alguém, mas... ora, não sejamos tolos! Não é preciso ser muito
talentoso ou especial para tanto, é?
E só.
Ainda assim, crescem. Uma semana. Outra. Crescem ainda.
Crescem e se descascam crescem e se desgastam crescem e se
despedaçam. Definham. Por uma semana - quanto muito. Na única
finalidade de morrer com um movimento de dedos que mal dura um átimo.
Que foram? Quem foram? Uma semana de nada?
- Que existência estúpida. Repete sem ver que olha o espelho.
Uma semana. Outra. Segue-se ainda. Indo-se as unhas pela descarga indo-se os cabelos
pelo vento indo-se os pés no asfalto indo-se o corpo pelo ralo como
um chorume que escorre de sua vida espremida pela contagem
regressiva. Vai-se o peso, vai-se um certo brilho, vai-se a vontade
de não querer se ir. Todos os dias vão-se no tempo e, a cada
semana, quando assopra para longe mais uma fileira de seu calendário
imaginário, quem foi? Que foi? Que fez além de enroscar-se em tudo
até ser nada além de incômodo? Que fez além de perder uma semana
de chances de ser um algo qualquer? E outra. E outra.
Nada. Francamente! Nada. Agarra o vidro de acetona e a caixa
de algodão.
- Que existência estúpida. Ela diz.
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