lundi 27 mai 2013

Suicídio




As marcas das pedras na pele exposta
Os pés nunca mais lamentaram
O toque embrasado do fogo solar
Não era mais dor que se evitasse
As pedras de gelo e a chuva grossa
Tampouco agora incomodavam
Nem urros, sussurros, sorrir ou chorar
Feriam de modo que incomodassem

O céu nunca mais foi mirado
O mar nunca mais avistado
E os sons nada mais que ruídos
Nenhum verde mais foi encantado
Nenhum passo de novo dançado
E os sabores não mais permitidos

Sem armas, as mãos viram garras
Língua vira farpa
Olhos viram brasa

Sem força, despencam-se as asas
Opção vira carma
Peito vira casa

Sem sonho, foge todo o medo.
Sem esperança, o desassossego.
E desapega-se do apego.

Liberdade, em fim.
Tudo para o alto.

Desceu lentamente garra
Mirou gravemente farpa
Dispôs sutilmente a brasa

Nunca mais quis querer voar.
E matou todas as borboletas.



[Imagem: The Hostile Branches Of Whistling Fog Forest, Brook Shaden]

lundi 6 mai 2013

Distorção Bárbara

Não existe "lugar do outro".
O lugar do outro, por si só, é segregação.
O lugar do outro é o teu lugar.

Não existe o "abrir espaço para o outro".
Abrir espaço para o outro é julgá-lo incapaz.
Abrir espaço para o outro é ser o seu espaço.

Não existe "ensinar o outro a falar".
Ensinar o outro a falar é torná-lo mudo.
Ensinar o outro a falar é aprender a sua fala.

Relações são mãos duplas e o cânone é uma palhaçada.
É um palhaço, no topo do mundo, esperando que se curvem.
É uma piada, de língua estrangeira, esperando que a entendam.

Tu e ele são iguais.
O Mundo é, para vós, um só.
E não pertence.
E não serve.
A nada.
E nesse nada Tu e Eu somos o mesmo.

A civilização é uma invenção dos fracos.
E nesse nada, a civilização é a barbárie.


mercredi 1 mai 2013

O Décimo Primeiro Mandamento


"E trabalha, mata-te a trabalhar, rebenta se for preciso, que assim deixarás boa lembrança no feitor e no patrão."
[SARAMAGO, José. Levantado do Chão, p.74]



O que é que se faz quando a submissão se torna em virtude? Quando o auto-flagelo é ostentado por troféu?
É preciso rever as prioridades... É preciso e logo...


"Tendo nascido para trabalhar, seria uma contradição abusarem do descanso. A melhor máquina é sempre a mais capaz de trabalho contínuo, lubrificada que baste para não emperrar, alimentada sem excesso, e se possível no limite econômico da simples manutenção, mais sobretudo de substituição fácil, se avariada está, velha outra, os depósitos dessa sucata se chamam cemitérios."
[p.327]